domingo, 17 de outubro de 2021

Cidade Alta tem menor número de negócios ativos em 10 anos


Na av. Princesa Isabel, várias lojas foram fechadas durante a pandemia, uma delas a livraria Asa Branca, uma das maiores do centro

Se anos atrás a Cidade Alta era o berço de um comércio pulsante, hoje, o bairro, que é o mais antigo de Natal, sofre os impactos das transformações pelas quais passa a capital. Diminuição do fluxo de pessoas nas principais ruas e avenidas, lojas vazias ou com baixo movimento, além de um cenário que salta aos olhos: diversas empresas fechadas. Entre janeiro de 2021 e o começo deste mês de outubro, 2.164 empresas foram extintas segundo dados da Junta Comercial do Rio Grande do Norte (Jucern). O órgão informou ainda que, em 2021, a região possui 2.023 negócios ativos, o menor número dos últimos dez anos. Em 2011, o número de empresas que estavam ativas no bairro era de 2.581, segundo a Jucern. 

Especialistas ouvidos pela TRIBUNA DO NORTE afirmam se tratar de um fenômeno histórico e que mantém relação direta com o desenvolvimento de outras áreas da capital. 

Para efeitos de comparação, no Alecrim, os negócios ativos, apesar de algumas oscilações, manteve a tendência de crescimento em dez anos. Se em 2011, a Jucern registrava 3.037 empresas em atuação, neste ano, o número está em 3.467. Os negócios extintos eram  4.406  em 2011. Neste ano, o número está é de 3.585.

Para quem ainda está na Cidade Alta, o cenário é de incertezas. Herbert Lopes é gerente de uma loja de calçados na Avenida Rio Branco, a principal via do bairro. Nos últimos anos ele viu a quantidade de clientes  diminuir abruptamente. “Hoje, aproximadamente 300 pessoas entram na loja por dia. Mas esse número já chegou a 800”, revela. A redução acarretou o enxugamento do quadro de funcionários.


“Estou na loja há quatro anos, desde que ela foi instalada aqui. No começo, o movimento era muito bom. Nós tínhamos 16 vendedores, mas hoje são apenas sete. Isso, por causa do fraco movimento”, conta Herbert. Ainda na Rio Branco, o vendedor de móveis, Anderson Santos, descreve como o movimento na loja onde ele trabalha reduziu nos últimos anos.

“A loja chegou na Cidade Alta há cerca de oito anos. O comércio era  bom, com muita gente circulando. Hoje, a maioria das lojas está fechada.  O bairro está ficando esquecido. Escuto muitos outros lojistas dizendo que vão fechar”, conta. O vendedor afirma que o perfil dos clientes que frequentam a loja mudou ao longo dos mais recentes anos. “Quem vem aqui, vem de forma aleatória ou por indicação. Já perdemos 60% dos nossos clientes”, lamenta.

Luís Carlos Mendes, que trabalha em um restaurante na Princesa Isabel, (outra via bastante agitada do bairro), há 18 anos, também relata que, nos últimos tempos a situação tem se apresentado de forma pessimista para os negócios do bairro. “Quando eu cheguei aqui, a gente recebia tanto cliente que tinha dia que não conseguia nem almoçar. Hoje, abrimos das 10h às 14h30, mas antes, nem tinha hora definida para fechar”, comenta.

Aos sábados, relata, a mudança foi ainda mais brusca. “Era uma dia em que a gente vendia 300 almoços. Agora, vendemos 25 ou 30, no máximo”, afirma. Em meio à crise, os que atua nos negócios da região, não vislumbra possibilidade de melhorais no curto prazo.

“Acho que as coisas vão demorar a melhorar e creio que não serão como antes, porque não tem gente circulando por aqui”, diz Luís Carlos Mendes. “Não acredito em melhora nesse cenário. Pelo menos não imediatamente”, completa o vendedor Anderson Santos.

O gerente Herbert Lopes é um pouco mais otimista. “Tenho certeza que as coisas vão melhorar, principalmente agora com a pandemia indo embora. Já tem muita gente vacinada e que ficou em casa sem comprar nada por muito tempo”, prevê Lopes.

Novos polos comerciais atraem negócios

Fatores como reestruturação comercial, organização urbanística e aspectos históricos são os responsáveis pelas alterações observadas na Cidade Alta nos últimos anos e que tem culminado no declínio comercial do bairro, de acordo com a avaliação da Fecomércio RN e de especialistas ouvidos pela TRIBUNA DO NORTE.

Para o economista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), William Eufrásio Nunes, o que acontece na Cidade Alta é o reflexo de uma mudança observada em outras partes do Estado, mas com ênfase na capital, com o surgimento de novos polos comerciais. 

“Em Natal, novas áreas de comércio têm surgido e se fortalecido. A zona Norte, o Alecrim e a implantação de novos shoppings são exemplos disso. Então, o Centro vem perdendo aquela característica natural, de ser um polo comercial. Isso aconteceu com a maioria das grandes e médias cidades do País. Historicamente, parte dessa caraterística [de polo comercial] vai ficando para trás”, explica.

Para a arquiteta e urbanista Sophia Motta, a forma como a região está organizada, do ponto de vista urbanístico, pode esclarecer o porquê de o bairro sofrer atualmente com a fuga de negócios da região.

“A Cidade Alta se consolidou como centro comercial. Ou seja, é uma área viva durante o dia e morta à noite, com o predomínio de um único uso. E nós estamos falando de comércio. Se é assim, primeiro é necessário ter um fluxo de pessoas, por que só aí é que os negócios vão se instalar. Portanto, a presença de pessoas é fundamental para requalificar a área. É assim em qualquer centro urbano do mundo”, pontua a arquiteta.

O presidente da Fecomércio RN, Marcelo Queiroz, segue cartilha semelhante ao analisar a situação do comércio na Cidade Alta. “De uma forma geral, percebemos um fortalecimento de centros comerciais em outras áreas de Natal, como as zonas Sul e Norte, bem como o crescimento dos shoppings e do comércio no bairro do Alecrim. Também acrescentamos o fato de que, para um comércio ser forte, é essencial um fluxo significativo de pessoas. Atualmente, não temos grandes pontos de atração de fluxo no Centro”, detalha Queiroz.

Cenário

Registros de negócios ativos e encerrados 
Cidade Alta
Negócios ativos 

2011 2.581
2012 2.597
2013 2.594
2014 2.580
2015 2.610
2016 2.570
2017 2.543
2018 2.477
2019 2.390
2020 2.256
2021 2.023 

Negócios extintos

2011 2.597 
2012 2.607 
2013 2.609 
2014 2.591 
2015 2.581 
2016 2.531 
2017 2.459 
2018 2.384 
2019 2.314
2020 2.225
2021 2.164

Alecrim
Negócios ativos

2011 3.037 
2012 3.117 
2013 3.217 
2014 3.307 
2015 3.373 
2016 3.405 
2017 3.382 
2018 3.391 
2019 3.414 
2020 3.465 
2021 3.467  

Negócios extintos

2011 4.406  
2012 4.404  
2013 4.408  
2014 4.384  
2015 4.358  
2016 4.277  
2017 4.128  
2018 3.999  
2019 3.863 
2020 3.722 
2021 3.585

Fonte: Jucern

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